O uso adequado de cartões corporativos é fundamental para a gestão pública responsável. Ao entender sua origem, regras e práticas recomendadas, gestores podem evitar abusos e reforçar a confiança na administração.
O Cartão de Pagamento do Governo Federal (CPGF), conhecido como cartão corporativo, surgiu para substituir cheques na administração pública. Ele funciona de modo similar a um cartão de crédito empresarial, mas está restrito a despesas de pequeno valor ou emergenciais. Essas operações são tratadas como adiantamento para despesas com necessidade de comprovação, exigindo futura prestação de contas. Seu principal papel é agilizar procedimentos quando a licitação prévia não se mostra viável sem comprometer os princípios legais.
Entre as aplicações mais comuns estão custos de deslocamento, alimentação em viagens oficiais, aquisição de materiais de consumo e pagamento de serviços de pequena monta. Normalmente, cada órgão define limites individuais por transação e por período, garantindo que o cartão não seja utilizado de forma incessante ou para compras de grande vulto.
Por exemplo, um servidor em missão oficial pode usar o cartão para custear passagens aéreas, diárias de hotel e refeições, desde que apresente relatórios e notas fiscais para comprovar cada gasto. Esse fluxo rápido reduz a burocracia típica dos processos licitatórios quando o valor envolvido não justifica tramitação extensa.
O uso do cartão corporativo está condicionado a normas que asseguram legalidade e eficiência. Entre os principais dispositivos estão decretos e leis que detalham limites, modalidades de gasto e exigências de comprovação.
Essas normas determinam que todas as aquisições atendam aos princípios constitucionais da administração pública, mantendo a economicidade e a transparência em cada etapa do processo. Mesmo sem licitação prévia, é obrigatório justificar a necessidade do gasto e selecionar fornecedores com base em pesquisa de preços.
O descumprimento de diretrizes, como a falta de apresentação de comprovantes ou extrapolação de limites, pode acarretar em penalidades que vão desde advertências a afastamento de servidores e devolução de valores acrescidos de multas e juros.
Embora ofereça agilidade, o uso do cartão corporativo demanda controle rigoroso. Cada despesa deve ser acompanhada de nota fiscal, recibo ou documento equivalente, além de uma justificativa detalhada. A modalidade de suprimento de fundos impõe prazos estritos para prestação de contas sob pena de sanções administrativas.
Gestores precisam acompanhar relatórios de fatura, validar notas e realizar reconciliações periódicas. A adoção de sistemas eletrônicos, como o SIAFI e portais próprios de compras, fortalece o monitoramento, reduzindo erros e fraudes. Esses sistemas costumam gerar alertas automáticos para despesas atípicas ou fora do perfil do órgão.
Além disso, é recomendável instituir fluxos de aprovação em vários níveis hierárquicos. Por exemplo, o chefe imediato deve revisar a comprovação inicial, enquanto o setor de contabilidade faz a conferência final antes de encaminhar à auditoria interna.
O debate sobre transparência completa e obrigatória intensificou-se recentemente no Congresso. Projetos de lei, como o PL 2.695/2019, visam criar a publicação automática de todas as despesas com cartões corporativos, sem necessidade de solicitação.
Essa mudança altera a Lei de Acesso à Informação, ampliando a divulgação para incluir faturas integrais, notas fiscais, justificativas e demais documentos. O objetivo é promover controle social e auditoria pública, permitindo que cidadãos e órgãos de controle acompanhem cada transação.
Comportamentos suspeitos podem ser identificados por meio de cruzamento de dados, como valores elevados repetidos por um mesmo usuário ou concatenação de despesas em períodos curtos. Auditorias independentes e o trabalho de tribunais de contas complementam a fiscalização, reforçando a governança pública.
A cultura de transparência ajuda a coibir práticas inadequadas, pois servidores sabem que suas decisões estarão sob análise de gestores, auditores e da sociedade civil organizada.
O uso deve se restringir a despesas emergenciais e de baixo valor, não cabendo aquisições de bens duráveis ou serviços de grande custo sem licitação. Entretanto, episódios de gastos excessivos e suspeitos marcaram recentes administrações, suscitando críticas sobre a falta de responsabilização e fiscalização rigorosas.
Os decretos preveem limites por transação, que variam conforme o órgão, e tetos mensais somados. Em muitos casos, porém, esses limites foram ultrapassados, resultando em pedidos de devolução de valores pela Controladoria-Geral da União e investigação por parte do Ministério Público.
No contexto da pandemia de Covid-19, algumas propostas chegaram a suspender o uso do cartão para todos os órgãos, exceto o Ministério da Saúde, tornando crime o uso inadequado desses recursos, em caráter excepcional.
Na gestão federal recente, investigações apontaram que gastos chegaram a superar em até 200% os limites estabelecidos. Em alguns casos, notas fiscais foram consideradas genéricas ou fraudulentas, sem detalhamento suficiente para comprovar o que foi efetivamente comprado.
Esses episódios prejudicam a imagem da administração pública, minam a confiança da sociedade e oneram o contribuinte. Requerem instauração de Comissões Parlamentares de Inquérito, ações civis por improbidade administrativa e responsabilização criminal em casos mais graves.
Para evitar recorrências, a experiência demonstra a necessidade de: revisão constante dos processos, capacitação de servidores e adoção de indicadores de desempenho para monitorar a eficiência do uso.
Para assegurar o uso responsável dos cartões corporativos, sugerem-se as seguintes práticas:
Além disso, a troca de experiências entre órgãos e a adoção de tecnologia de Business Intelligence para análise de dados ajudam a identificar padrões de uso e possíveis irregularidades, garantindo um ciclo contínuo de melhoria.
O uso de painéis de controle (dashboards) permite visualizar em tempo real itens como gastos por categoria, por usuário ou por tipo de despesa, facilitando a tomada de decisão e o ajuste de limites conforme a necessidade.
O cartão corporativo é uma ferramenta poderosa para tornar a administração pública mais ágil e eficiente. No entanto, sem controles adequados, ele pode se transformar em fonte de desperdício e corrupção. Por isso, é imprescindível que cada etapa, desde a autorização até a prestação de contas, seja realizada com rigor e transparência.
Ao alinhar o uso dos cartões corporativos aos princípios da administração pública, fortalecer a fiscalização e promover a transparência, gestores e cidadãos constroem uma cultura de responsabilidade e confiança. Esse compromisso não beneficia apenas a máquina pública, mas toda a sociedade, que passa a contar com recursos melhor aplicados e processos mais íntegros.
Referências